Pontos de mergulho em Paraty: 01 - Ilha dos Ganchos 02 - Ilha Comprida 03 - Ilha Catimbau 04 - Ilha dos Meros (a Ilha dos Cocos fica próxima) 05 - Praia Vermelha 06 - Praia da Lula 07 - Paraty-Mirim 08 - Cachadaço 09 - Cajaíba 10 - Praia dos Antigos Fonte: http://www.paraty.com.br/mergulho.asp |
Fomos para Paraty no último final de semana, animados para mergulhar novamente. E começo este relato com a informação mais celebrada pela minha pessoa sobre a experiência: Paraty é o destino perfeito para as pobres almas que, como eu, sofrem com enjoo de movimento.
O mar é tão calmo que o barco vai suave e é possível curtir o sol e a paisagem em vez de entrar naquele estado azul-zumbi de quem está tentando manter o estômago do lado de dentro do corpo.
Foi com essa feliz constatação que, aproveitando o dia ensolarado e o céu aberto, venci sem problemas no sábado de manhã o percurso de lancha até a Ilha dos Meros para nosso primeiro mergulho.
E desta vez havia um fator inesperado na equação. A turma com a qual viajávamos era formada por dois grandes grupos, um de check-out (o chamado batismo) básico e outro de check-out Rescue, além de um grupo menor de check-out Avançado.
Ou seja: mais ninguém ali estava apenas a passeio, e os dive masters estariam na água acompanhando os grupos em prova. Isso basicamente significava que o Mark e eu estaríamos à mercê do nosso senso de localização, que, no meu caso, é inexistente. Eu mal consigo “navegar” pela Marginal Tietê sem me perder ou me confundir com as placas, imagine ter que se localizar debaixo d’água usando referências tão precisas quanto uma pedra ou a vegetação…
Mas o local era bem abrigado, sem muita correnteza e, depois de pegar algumas dicas com os dive masters, fomos em frente. Dessa vez, lição aprendida com a Laje de Santos: não esqueci o shampoo de bebê na máscara, que lindamente não embaçou.
A alegria de aproveitar a paisagem (foto por Theo Costa) |
O começo foi meio confuso: nadávamos para um lado achando que estávamos indo para o outro, tivemos que subir uma vez para nos localizar, mas por fim escolhemos um sentido e seguimos com ele.
Com o mar tão calmo, eu achava que teríamos uma boa visibilidade, mas a água estava bastante turva. Nada que se comparasse ao nosso check-out em Ubatuba, quando eu mal podia enxergar o braço do Mark do meu lado, mas bem inferior à nossa última experiência em Santos.
Outra coisa que pegou foi o termoclina. A diferença de temperatura era tamanha que não dava para ir muito abaixo de 5m sem as mãos começarem a doer de frio, e os bolsões gelados eram bem mais extensos do que tínhamos sentido em Santos. Mesmo os peixes procuravam ficar mais perto da superfície, no quentinho, então foi um mergulho bem raso.
Ainda assim, deu para aproveitar muito. Vimos muitos tipos de peixes e corais e algumas curiosidades, como uma gruta cuja entrada era guardada por uma grande placa de metal com o símbolo da maçonaria e uma estátua gigante de Jesus Cristo no fundo do mar, coberta de vegetação e com peixes nadando inabalados ao redor.
Um dos dive masters indicou que havia um jatinho afundado em um ponto ali perto e fizemos de tudo para encontrá-lo, mas a visibilidade não estava essas coisas e o mar acabou nos levando para longe. Quando subimos mais uma vez para nos localizar, percebemos que tínhamos que voltar um bom pedaço.
A correnteza já estava bem mais forte nessa altura e insistia em nos puxar para o lado contrário. Tive dificuldades em compensar ao tentar descer de novo, um pouco pelo frio, um pouco pelo nervoso de sentir o mar puxando, então, depois de 47 minutos de mergulho, acabamos desencanando de descer novamente e vencendo no nado a distância até o barco, com o meu barômetro já indicando o ar nos 50 BAR.
Isso ilustra como o nervosismo interfere no consumo de ar: eu geralmente termino meus mergulhos com muito mais ar no cilindro do que o Mark, mas dessa vez foi o contrário.
Mergulho 2 – Ilha dos Cocos
Na esperança de maior visibilidade e menos correnteza, saímos em direção à Ilha dos Cocos. Totalmente livre de enjoos, eu pude até cometer as heresias das heresias e realizar o impensável: comer no barco.
O cachorro-quente que a maioria das companhias costuma oferecer de lanchinho entre um mergulho e outro para mim sempre foi uma espécie de inalcançável manjar dos deuses. Poder desfrutar pela primeira vez da regalia foi sensacional. Nunca um cachorro-quente, mesmo sem condimento nenhum (que o seguro morreu de velho), foi tão gostoso!
Aportamos em uma baía bem abrigada que à primeira vista não me impressionou. Era uma área cercada de casas, com um píer em uma das extremidades, que parecia mais uma represa.
Mas foi só cair na água que a minha primeira impressão se mostrou errada. O termoclina ainda era forte, mas a visibilidade estava bem melhor e lugar era cheio de vida, movimento e cores. Logo no início do mergulho tivemos a sorte de avistar uma arraia nadando na maior calma e saímos desembestados atrás dela, porque é um peixe lindo de se ver (e perseguir!).
Vimos muitos peixes – alguns cações violas, que são parecidos com a arraia, mas têm o corpo mais chato e a cauda maior – e muitos corais, estrelas marinhas e outras formas de vidas. O frio ainda castigava bastante, e o Mark provavelmente bateu o recorde mundial de câimbra, sofrendo com três durante o mergulho. O shampoo de bebê fez milagres com a minha máscara, que não embaçou nada, mas o Mark sofreu com a dele.
Siga aquele peixe! (foto por Theo Costa) |
Como eu geralmente sou a parte da dupla dando problema, foi bem diferente ver o Mark desconfortável e eu tão de boa. Tentei fazer o que podia para ajudá-lo, mas também sem ficar no caminho. Ele levou a situação super bem, muito mais do que se fosse comigo, e o mergulho foi excelente.
O único contratempo que tive foi quando o mordedor do meu regulador rompeu e começou a entrar água. Isso é comum acontecer com reguladores alugados, tanto pelo excesso de uso como porque mergulhadores iniciantes costumam descontar a tensão travando o regulador na boca com toda força do mundo. Depois de sofrer com dores na mandíbula após meu primeiro mergulho, eu nunca mais tive esse problema. Mas o mordedor já vinha dando sinais de fraqueza antes e no segundo mergulho ele se foi, deixando o respirador frouxo na minha boca e dando espaço para a entrada de água.
Se em Santos eu entrei em pânico quando o mesmo aconteceu e subi para a superfície chamando pela minha mãe, agora eu agi do jeito certo: mantive a calma, tirei o regulador da boca, continuei a respirar soltando bolhinhas (a regra número um do mergulho, vale lembrar, é nunca prenda a respiração), localizei e pus na boca meu regulador reserva, lembrando-me de soprar antes de puxar ar para expulsar a água dele.
A operação é extremamente simples e é um dos processos básicos que você aprende no curso de iniciante. Mas, na hora do vamos ver, quando você está lá embaixo e de repente começa a sentir água entrando na boca, a primeira reação (pelo menos a minha) é surtar e querer subir. Então, licença para dizer que fiquei contente com meu autocontrole.
Com pontos de referências muito mais práticos desta vez (nem eu sou tapada o suficiente para deixar de notar um píer debaixo d’água), nossa navegação foi bem tranquila, não precisamos subir nenhuma vez e, mantendo a profundidade na média dos 5m por causa do frio, o consumo de ar foi bem baixo. O mergulho durou 60 minutos, nosso recorde, e eu ainda tinha 75 BAR de ar quando subimos. Aí, sim!
Interlúdio – Paraty em terra firme
Fomos à noite para o centro de Paraty, um grupo de vinte mergulhadores desesperados por comida. Uma francesa que estava conosco fez um comentário interessante, de que ali “não parecia o Brasil”. A cidade é realmente uma viagem no tempo, com ruas de pedra, construções coloridas e lajotas portuguesas em quase todas as casas.
Paramos no primeiro restaurante com lugar para a galera toda. Uma dica para quem for para Paraty: experimente os doces vendidos nos carrinhos de rua. Eles estão espalhados por vários pontos do centro histórico e trazem opções deliciosas. Comi um pedaço de bolo de tapioca de chorar de tão bom.
Outra dica: não utilize quantidade de mesas livres para abrigar seu grupo como critério para escolher restaurante, mesmo que fome esteja te mandando parar no primeiro lugar que aparecer pela frente.
Mergulho 3 – Ilha dos Meros, ponta norte
Domingo era meu aniversário e, mesmo tendo acordado com a cabeça estourando de dor, eu fui mergulhar na esperança de que uma tartaruga aparecesse para me dar os parabéns. Voltamos para a Ilha dos Meros, dessa vez a ponta norte, esperando melhores condições. A visibilidade tinha melhorado, mas o termoclina ainda era forte e das poucas vezes que descemos até 6m eu achei que fosse congelar.
Mantivemos o mergulho a 5m e fomos rodeando por entre as rochas. A experiência de mergulhar entre pedras com corais é muito legal. É bacaníssimo parar em frente a uma pedra e ficar lá quietinha, controlando a respiração para não agitar muito a água, e em pouco tempo começar a enxergar um monte de coisinhas se mexendo, peixes que tinham se escondido saindo debaixo da vegetação, pequenas vidinhas andando pelos corais.
Nenhuma tartaruga apareceu, para minha frustração, e conforme o mergulho progredia minha dor de cabeça só piorava. Depois de um tempo, meu estômago também começou a dar sinais de não estar nos melhores dias. Não permiti que isso atrapalhasse a experiência, mas o incômodo permaneceu. A princípio, achei que o cinto de lastro podia estar apertado demais na região do estômago ou que a cabeça doía por barotrauma de máscara. Mexi no cinto como podia e me policiei para deixar ar e água na máscara para aliviar a pressão no rosto, mas nada fez muita diferença.
Corais são legais |
Consegui me distrair das mazelas com a fantástica paisagem diante dos meus olhos, com os corais roubando a cena. Vimos muitos peixes, de todos os tamanhos e cores, desde milimétricos até peixões enormes e coloridos. Estávamos controlando nossa localização pelo tempo de mergulho e consumo de ar e, quando resolvemos voltar, optamos por contornar as pedras que havíamos rodeado na ida.
Continuamos a nadar crentes de que encontraríamos nosso ponto de referência. A vegetação foi mudando, os corais deram lugar a um paredão de areia, e aquela sensação de “não passei por essa rua na ida” foi batendo forte. 57 minutos de mergulho depois, resolvemos subir. E aí descobrimos que já havíamos passado faz tempo do barco, que nessa altura era só um pontinho lá longe no horizonte.
Sem muito que fazer a respeito, começamos a nadar de volta, concluindo que nos perdemos quando contornamos as pedras pelas quais tínhamos nadado no meio na ida. E aí, debaixo do sol, cansada e com o peso do equipamento se fazendo sentir, meu mal-estar ficou forte. A cabeça latejava, o estômago revirava… Mas mantive o foco na direção do barco, coloquei o rosto na água e fiquei com o respirador na boca para nadar mais rápido. Nesse período, ouvi três apitos vindos do barco, mas super achei que não era comigo.
Até que dois mergulhadores da equipe de check-out de rescue e um dive master apareceram nadando ao nosso encontro. Eles ficaram preocupados por o capitão do barco ter sinalizado três vezes para nós perguntando se estava tudo ok e não ter tido resposta. Pois é, aqueles apitos. Ops, foi mal aí, gente.
Nadamos em grupo de volta para o barco, e eu suponho que minha cor não devia estar das mais saudáveis, porque o pessoal do resgate se ofereceu para me rebocar e me livrar do equipamento. Eu aceitei feliz, me livrei do peso todo e fui batendo perna e segurando na boia até perto do barco. Não quis subir porque achei que ficaria pior.
Mas o estrago já estava feito e lógico que eu fui premiada por passar mal na única viagem em que efetivamente não senti enjoo por causa do barco. Maldito peixe com molho de camarão. Vomitei até a alma, sendo amparada por um dos membros da equipe de resgate e o Mark, que mais uma vez foi o herói do dia e não saiu do meu lado.
O que posso dizer sobre a experiência: não recomendo a ninguém vomitar com a cabeça dentro d’água. E feliz aniversário para mim, né!
O não-mergulho, ou fazendo a alegria da equipe de resgate
Depois do ocorrido, a cabeça ainda doendo e o estômago revirado, eu não tinha clima para voltar a mergulhar. Indiquei para o Mark que não ia rolar descer de novo e que ele deveria aproveitar para ir com o pessoal que tinha acabado o check-out avançado e ia só passear. Foi o que ele fez. Da minha parte, continuei no mar até meu estômago se acalmar o suficiente para eu subir no barco e de lá fiquei observando os exercícios da equipe que se formava em resgate.
O engraçado é que o pessoal de resgate parecia realmente grato por poder aplicar os conhecimentos adquiridos em uma “vítima” de verdade e vinha toda hora checar se eu estava bem. O curso parece ser extremamente cansativo – no dia anterior, perdemos a conta de quantas vezes os coitados tiveram que se jogar no mar e nadar em simulação de resgate –, mas também bem divertido, ainda que em um nível meio masoquista. Definitivamente, algo para se considerar fazer no futuro. Mas é preciso muita familiaridade com o equipamento e agilidade no processo de mergulho. Só o tempo que eu demoro para colocar as nadadeiras e a roupa de neoprene seria suficiente para uma vítima se afogar três vezes! Além de, é claro, tomar o cuidado de comer num lugar decente na noite anterior.
Mas mesmo com esse contratempo e com as sete longas horas de trânsito voltando para São Paulo depois, foi uma viagem que valeu a pena. Ter que se localizar por conta própria embaixo d’água te obriga a prestar muito mais atenção em coisas menores, não só nos peixes (se bem que seria a minha cara usar como ponto de referência “aquele peixão preto e amarelo”), e a ficar mais atento à vegetação, além de te forçar a manter a flutuabilidade e a profundidade constantes. Mesmo que não dê tão certo quanto você gostaria. No final, ficou a vontade de fazer o curso avançado logo para aprender a usar a bússola e ter uma ideia melhor de para onde se está indo.
Lições aprendidas com Paraty: comprar urgentemente uma luva para conseguir encarar termoclinas sem grandes problemas. Comprar uma nadadeira com alças no calcanhar (as minhas são fechadas) para facilitar a natação e a preparação para o mergulho - e quem sabe a futura certificação em rescue. Tomar cuidado com o que se come nas noites anteriores ao mergulho. E já começar a juntar dinheiro para o curso avançado!